quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

A Idade Média nunca existiu: é um mito! Parte II



A terceira questão relacionada ao conceito de Idade Média e que considero importante para essa discussão, é a noção de periodização. Ela tem sua importância didática e o seu uso é inevitável, mas coloca também questões para o pesquisador e estudioso. A periodização é também uma construção, baseada em escolhas feitas pelo historiador, estabelecendo aquilo que deve ser lembrado/esquecido. As periodizações são construídas com base em características estabelecidas para determinado período. O caso da Idade Média talvez seja o mais significativo.
Estabeleceu-se para esse momento marcos divisórios que vão do século V ao século XV (mil anos). É preciso ter em mente que houve muitas rupturas, descontinuidade ao longo desse tempo, apesar das permanências, e que não se pode homogeneizar esse período com base em características comuns como fizeram os humanísticas do século XVI e os nacionalistas do século XIX. Também é preciso esclarecer que a Idade Média refere-se à história europeia e que os valores defendidos pelos personagens que a viveram não eram os mesmos em todos os lugares num mesmo tempo e nem durante todo aquele período.
Em quarto e último lugar, é preciso ter em mente que a produção sobre qualquer período histórico é fruto de escolhas dos historiadores, conscientes ou não, que produzem e, por que não dizer, inventam a história.
Concordamos com Le Goff quando propõe pensar a Idade Média de modo a historicizá-la em todas as suas facetas sem essa ou aquela intenção a priori, mas sim com o propósito de pensar o homem em seu tempo. Para ele, como para Marc Bloch, a “História é a ciência do homem no tempo”, e isso leva o trabalho historiográfico não para a identificação de fatos e pessoas, mas para a compreensão sobre as possíveis mudanças de um determinado contexto.
Embora os estudos sobre a Idade Média tenham se renovado, sobretudo a partir da chamada História Nova, e tenha inventado um outro conceito do medievo, que combate as visões cristalizadas, preconceituosas sobre o ele, permanece no imaginário uma visão negativa para caracterizá-lo. É que quase não há diálogo entre o que se produz na universidade e o Ensino Básico. Muitas vezes os livros didáticos demoram para incorporar essas novas produções e acabam reforçando visões estereotipadas, preconceituosas sobre a Idade Média, com algumas exceções, é bem verdade.
Dito de outra forma, embora tenha havido uma renovação no campo dos estudos medievais, desde Marc Bloch e Lucien Febvre, com a História Nova, que buscaram pensar a Idade Média com base na história das mentalidades, das imagens e gestos, do imaginário, alargando e problematizando o seu conceito, muitas vezes permanece a noção anterior, reforçada pelos manuais didáticos
Em primeiro lugar, nem sempre o conteúdo sobre Idade Média presente no livro didático é escrito por um especialista, o que contribui para falhas. Em segundo lugar, o mercado livreiro não deixa muito espaço para uma elaboração mais apurada dos conteúdos presentes nos manuais, o que acaba comprometendo a sua qualidade, levando à simplificações, construção de padrões gerais, lugares comuns já superados pela historiografia, o pouco cuidado na exploração dos documentos e que são reproduzidos, muitas vezes apartados dos textos, apenas em boxes, e com a iconografia colocada ali apenas para ilustrar, sem que sejam usadas para permitir a interpretação, o que daria ao aluno a possibilidade de se familiarizar com os procedimentos básicos do trabalho do historiador.
Muitas vezes também os professores de história do Ensino Básico têm como única ferramenta pedagógica, o livro didático, e acabam reforçando o que está escrito naquele suporte, entendendo-o como a única verdade, não buscando se apoiar na produção acadêmica.

É preciso reconhecer, no entanto, que há muitos bons livros didáticos e uma preocupação maior em incorporar os novos estudos. Para o seu uso, no entanto, é preciso ao professor estar atento para o fato de que para além da transmissão de conteúdos já cristalizados é imprescindível que os alunos compreendam que o conhecimento histórico é resultado de criação, da pesquisa, que comporta descoberta e invenção. O conhecimento histórico não pode ser encarado como um amontoado de fatos, nomes e datas, mas como uma disciplina que contribua para a formação intelectual do indivíduo.
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2 comentários:

  1. Meu ilustre concordo com você sobre o preconceito sobre a Idade Média, pois até alguns livros falam a Idade das trevas, mas não foi Idade das Travas, pois na mesma tiveram grandes pensadores como Agostinho e Tomás de Aquino sendo teólogo e Filosofo e as Universidades da Europa. Como foi bem formulado a problemática do Professor Vitorino é interessante problematizar os livros didáticos, mas usar nas salas de aula os paradidáticos para fomentar os conhecimentos dos alunos. Abraço! Gilvan Sousa.

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  2. O tema é interessante e polemico caro Antonio Vitorino, a chamada idade média na realidade trata-se do periodo compreendido entre o esfacelamento do imperio romano que pouco a pouco, após o imperador Diocleciano, foi destruido pela balburdia militar, pelo caos politico que resultou na queda de Roma (476 AD). Entenda que o imperio nao caiu neste exato ano, mas paulatinamnete em todos os anos anteriores em que o caos foi dominando o imperio. Com o caos estabelecido e invasao de varias cidades, incluindo Roma por bárbaros as pessoas foram saindo das cidades, indo morar nos campos e começou entao a dificuldade de acesso a escolas, bibliotecas e foram minguando escritores, poetas, historiadores que encontravamos em grande quantidade antes do chamado declinio de Roma.
    Idade das trevas porque praticamente desapareceram os grandes intelectuais nos anos que se seguiram. Podemos contar nos dedos de cada mao quantos escritores chegaram aos nossos dias, que viveram em cada século neste periodo até os séculos XIV,XV e XVI. Grande abraço.

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