quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

O auxílio-moradia e a institucionalização da desigualdade no Brasil



Recentemente a Folha de São Paulo revelou algo assustador, que quase 18 mil juízes e quase 13 mil procuradores, no Brasil, recebem auxílio-moradia, no valor de R$ 4.378, mesmo possuindo imóvel próprio no lugar onde trabalham. O País gasta, só com juízes e membros do ministério público, com o benefício, cerca de R$ 1,6 bilhão por ano. Estima-se que, desse valor, R$ 1,4 bi são destinados àqueles que possuem imóvel no próprio local de trabalho. Há casos, como o do juiz federal da Lava Jato no Rio de Janeiro, Marcelo Bretas, e sua esposa, também juíza, que vivem em imóvel próprio, receberem, ambos, o auxílio.
            Essa imoralidade foi garantida, em 2014, por uma liminar concedida por Luiz Fux, membro do STF, que estendeu a todos os juízes e membros do ministério público, independente de qualquer coisa, o direito ao benefício. Com mais de três anos de vigência da liminar, que deverá ser julgada pelo STF em março, os gastos já custaram aos cofres públicos mais de R$ 5,4 bi.
É preciso lembrar que o auxílio-moradia é apenas um dos benefícios, não tributáveis, diga-se de passagem, que os magistrados, arautos da moralidade na atualidade, recebem, além de seus “minguados” salários, que chegam próximo ao de um ministro do STF, teto do servidor públicos, míseros R$ 33.763. O salário de um juiz está entre os 0,1% mais altos do país. Juízes do Rio de Janeiro, por exemplo, recebem também auxílios para despesa com transporte, refeição e educação dos filhos[1] até completarem 24 anos, segundo reportagem do Estado de S. Paulo.
Segundo o mesmo jornal, em São Paulo, juízes e desembargadores recebem um auxílio para a compra de livros, no valor de até R$ 5 mil por ano. No Maranhão esse valor é de R$ 1.300.  O orçamento do judiciário está na ordem de R$ 80 bi. Em 2015, segundo matéria da Carta Capital, o judiciário consumia 1,2% do PIB brasileiro, o mais caro do mundo ocidental.
A maior parte dos magistrados, indagados por jornalistas sobre se seria justo o recebimento do auxílio moradia, mesmo tendo imóvel próprio na cidade onde atuam, tem respondido de forma patética e ridícula, tentando justificar o injustificável. Fico a me perguntar sobre se eles não percebem o ridículo de tal atitude. Alguns têm respondido, como foi o caso de Sérgio Moro, que recebe o auxílio-moradia desde 2014, mesmo tendo imóvel em Curitiba, onde trabalha, confessando que o auxílio é um disfarce ou fraude para “compensar a falta de reajuste dos vencimentos”, caso ainda do procurador José Renato Nalini, para quem o auxílio moradia disfarça uma “defasagem”, por falta de aumentos, dos salários dos juízes (vídeo abaixo). Isso é, no mínimo, escabroso, assombroso.

Nesse caso específico parece que o direito anda a léguas de distância da ética e da moral e parece confirmar algo bem comum no nosso passado colonial e imperial: o de que a lei funciona como instrumento de garantia de castas, hierarquias sociais, privilégios e institucionalização da desigualdade histórica, marca da nossa sociedade.



[1] Os magistrados têm direito a verba mensal de R$ 1.136,53 para pagar mensalidade escolar. Quem tem três filhos, teto máximo, embolsa R$ 3,4 mil. Se a mensalidade for menor do que o valor do auxílio, a diferença cobre matrícula, material e uniforme.

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