segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

O retrato de Dorian Gray. Parte III





Sentido do romance
Um dos temas do romance, o ideal de beleza e perfeição, remete às influências da cultura grega. Remete ao mito de Narciso, que cultua a sua própria imagem e vive em função dela. Dorian Gray, um jovem belo e ingênuo, só reconhece sua própria beleza quando Basil pinta o seu retrato e Dorian está diante dele mesmo: “Ao vê-lo, recuou, e as maçãs de seu rosto erubesceram de prazer por um instante. Um ar de felicidade surgiu em seus olhos, como se lhe houvesse se reconhecido pela primeira vez. Ficou parado, imóvel, espantado, com uma consciência vaga de que Hallward estava falando com ele, mas sem apreender o significado das palavras. O sentido da própria beleza o assaltou como uma revelação. Ele nunca o tinha sentido antes”. (p. 34).
Como Narciso, que só reconheceu sua beleza ao ver a sua imagem refletida na água, Dorian só reconhece sua beleza ao estar diante de seu próprio retrato.
Também, como no Fausto de Goethe, o personagem central, Dorian Gray, bem que poderia ter feito um pacto com o demônio, vendendo sua alma em troca da beleza, juventude eterna, prazeres e poder. Embora não tenha feito nenhum pacto, a sua beleza e juventude resistem ao tempo. Dorian exprime seus sentimentos na seguinte passagem: “ ‘Como é triste!’ murmurou Dorian Gray, com os olhos ainda fixos no próprio retrato. ‘Como é triste! Eu vou ficar velho e horrendo e medonho. Ele jamais envelhecerá além deste dia de junho... Se pudesse ser diferente! Se eu permanecesse sempre jovem e o retrato envelhecesse! Por isso – por isso – eu daria tudo! Sim, não há nada em todo o mundo que eu não daria! Daria a minha alma por isso’”!
O herói do romance parece ter sido o personagem trágico criado por Oscar Wilde para atacar os valores puritanos. A obsessão de Dorian com o belo, a beleza superficial, e do prazer estava em desacordo com a moral arraigada da sociedade vitoriana na Inglaterra do século XIX. É um claro ataque à ideia de que a moral faz um grande homem e os pecados perturbam a consciência.
Oscar Wilde era adepto de um movimento chamado esteticismo, que defendia a “arte pela arte”, isto é, o que interessa é apenas o belo. Apenas o belo era a solução para os malefícios da sociedade. A arte poderia servir como um ataque ao tradicionalismo da sociedade inglesa da época vitoriana. Nesse sentido, seu romance não tinha pretensão alguma de trazer ensinamentos ou defender uma moral, uma postura.
Outro personagem, o Lorde Henry, parece ter sido criado para atacar os valores morais e a conduta aristocrática dos salões londrinos. A alta sociedade, civilizada, parecia viver, aos olhos de Wilde, mais da aparência do que de sua essência, que procura esconder seus pequenos “defeitos” em nome de uma posição de respeitabilidade e status social, o que se pode chamar de hipocrisia. Henry representa, ao que parece, o desejo de muitos: viver uma vida de prazeres sem se importar muito com suas consequências, embora essa vida seja levada a termo apenas por aquele que seduziu, o jovem Dorian Gray.
O romance também traz para discussão um tema que inquieta a humanidade: o medo de envelhecer. Questiona também a beleza, a juventude e os valores morais da sociedade.

Parece existir uma pergunta implícita no romance: o que mais vale: o corpo ou a alma?

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