sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

NUNCA É TARDE PARA CHORAR II de parte III



A FRAQUEZA DA CARNE

 FOLHETIM DE GABRIEL ARCANJO

A moça saiu, deixando atrás de si a aflição de sua lembrança, seu perfume de menina-mulher, e o eco perturbador da silhueta de seu corpo esguio na mente confusa do jovem celibatário. “A mulher é uma criação de Deus? Ou será do Diabo?” Pensou em seu íntimo, e ele mesmo respondeu em pensamentos: “- A mulher é obra do Cão!”
A noite caiu, como uma manta sinistra sobre a cidade que dormia, e o padre, que era um homem como todos os outros, voltou a ter sua mente ocupada pela lembrança da jovem loira, que ele vira pela manhã, no confessionário. Lembrou-se de seus olhos de esmeralda, de seus seios de melão maduro, de sua boca de jasmim, e pediu perdão ao bom Deus por sua fraqueza (mas ele era um homem como todos os outros, e o fantasma da loira continuou a ocupar seus pensamentos). Naquela noite, o pároco teve sonhos tenebrosos e medonhos, sonhos em que Maria, a linda moça filha rejeitada dos Araújo, lhe vinha invadir o quarto e o leito vestida apenas com uma camisola transparente. Era possível ver, por debaixo da roupa, o desenho loiro de suas partes íntimas, o bico pontudo de seus seios, o volume de suas ancas. Veio esbelta, na direção do homem de Deus, e ele titubeou: “-O que é que tu quer aqui, menina? -Eu quero você, meu padre! Disse-lhe, e correu para os seus braços, num alvoroço de amante sedenta! –Arreda-te de mim Satanás! Disse o religioso, empunhando um crucifixo, como a exorcizar o próprio Demônio! Arreda-te de mim! E ele, que havia jurado nunca pecar, nunca provar da carne sedosa de uma bela mulher, se viu vencido ali em sonhos, naquela noite, pelos beijos e pelos afagos da linda bruxa dos Araújo! Repetiu as palavras de Cristo na Cruz: - Meu Deus, por que me abandonaste? E se entregou a luxúria! Falou ele, num desmaio e num sussurro, vendo sua voz ser sufocada pelo beijo apaixonado da mulher-anjo, que se despia diante de seus olhos, e ele se viu derrotado, incapaz de resistir. E, num raio da manhã, despertou sozinho em seu leito sujo de suor e de sêmen: - Por que é que tu vens me perseguir, filha do pecado? Disse ele, entre o sono e a vigília, arrependido de seus pecados, com o peito em brasa, o falo em riste, e ouvindo lá fora o som surdo do vento no telhado, e a pressa da chuva ligeira de dezembro a lhe inspirar versos estranhos de amor:
Maria, o teu olhar
É a dor da vida na vida!
É navalha ardendo na ferida!
É o sonho da morte vivida!
É o trem que apita!
É o carro que corre!
É o tempo que passa!
É a vida que morre!
Maria, o teu olhar
É a forca do suicida!
É a navalha na ferida!
É a noite sem fim!
É o crime de Cãim!
É o silêncio eterno!
É o inferno!
É o céu!
Maria, o teu olhar,
É a chuva que vem,
É a vida que vai!
De longe, bem longe!
De dentro da noite sem fim!
É o crime de Cãim!
É a vida que morre!
Maria o teu olhar
É prisão de amargar!
É triste,
Como o luar!
É Fundo,
Como o oceano!
Maria,...
É teu olhar.


Continua...
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