terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Grêmio Ipuense. A ruína de um projeto - Parte II




O aparecimento dos salões e grêmios na cidade de Ipu, nos anos iniciais do século XX, é parte de uma tradição que, no Brasil, remonta aos primórdios do século XIX. O final deste século e anos iniciais do século XX são os momentos por excelência de sua proliferação na capital republicana, como demonstra Brito Broca em sua análise sobre a vida literária no Brasil[1]. Os salões e os clubes, no Rio de Janeiro, em fins de século, não eram também uma novidade, uma vez que estes espaços surgiram ainda muito cedo, após a chegada de D. João VI em 1808 e se desenvolveram durante o período Imperial, como bem demonstra Wanderlei Pinho em seu estudo sobre os Salões e Damas do Segundo Reinado[2].
No caso de Ipu, os salões e grêmios têm suas especificidades próprias. É resultado, principalmente, de uma ânsia ou vontade de um grupo de pessoas para viver a modernidade e, por meio deles, marcar posições, buscar distinções.
Quando foi fundado? Aqui há uma confusão. Historiadores e memorialistas locais, baseando-se na Revista dos Municípios, de 1929, aludem que aquela associação foi erguida em 1924. Citam como prova a passagem escrita naquele periódico ao dizer que ela “foi fundada em 1924, instalando-se no dia 12 de outubro desse anno, quando tambem realizou a partida inaugural e empossou a primeira diretoria”[3].
Mas o Jornal Gazeta do Sertão, que circulou em 1913, amplamente noticia sobre as partidas realizadas pelo Grêmio Ipuense em suas páginas, quase que semanalmente. Em uma de suas edições, ao noticiar sobre um de seus bailes diz que a associação existe há pouco tempo[4]. A questão é que em 1924 ela aparece com a denominação de Grêmio Ipuense Sociedade Recreativa Dançante. Trata-se de fato da mesma associação, pois seus frequentadores são os mesmos.
Segundo o Correio do Norte, jornal que circulou em Ipu entre 1918 e 1924, o Grêmio Ipuense foi fundado em 1912[5]. Ao se desfazer, deu origem, em seguida, ao Grêmio Recreativo 7 de Setembro. Este último se transformaria no Grêmio Ipuense Sociedade Recreativa Dançante. Mas, algumas mudanças foram operadas, o que muito provavelmente justifica as trocas de nomes.
As festividades ocorriam à noite e a sede do Grêmio era iluminada a carbureto. A solenidade revestia-se de certa formalidade. Os convidados (espécie de sócios) eram recebidos pela comissão de recepção, geralmente oito pessoas, e os conduziam ao salão de recepção, onde outra comissão, formada pelos diretores de salão, os recebia e os acomodava. Quando todos os convidados já estavam apostos, iniciava-se o que se chamava de “partida literária”. Era uma espécie de sarau literário. Ao que parece, fazia-se um discurso retórico, liam-se poesias e abria-se o espaço para discussões entre os intelectuais. Servia-se, aos presentes comida e bebidas, de responsabilidade da comissão de Buffet, sob a direção de pelo menos quatro pessoas. Finalmente, uma banda contratada tocava quando o salão de festa se abria para as danças. Neste momento, o espaço era da soirée e entrava, muitas vezes, pela madrugada.

Continua...

Sobre a imagem: Palacete Iracema. Fotografia que consta no Álbum Comemorativo do Centenário de Emancipação Política da cidade, de 1940. Cópia digitalizada pertencente ao acervo do autor. O documento original é do acervo de Francisco de Assis Martins.

[1] BROCA, Brito. A vida literária no Brasil – 1900. 4. ed. Rio de Janeiro: José Olympio: Academia Brasileira de Letras, 2004.
[2] PINHO, Wanderley. Salões e Damas do Segundo Reinado. 3. ed. São Paulo: Livraria Martins Editora, 1959.
[3] Cf. Revistas dos Municípios. Op. cit., p. 44.
[4] Assim inicia o artigo ao dar ampla divulgação do sarau realizado em seus salões, por ocasião da passagem do dia 7 de setembro. “Às justas glorias do que já se ufana o ‘Gremio Ipuense’ em seu curto período existencial [veio] juntar-se a da elegante e linda recepção dada aos seus associados em a noite do 7 de setembro”. Gazeta do Sertão. Ipu, p. 4, 12 Set. 1913.

[5] Gremio Recreativo 7 de Setembro. Correio do Norte. Ipu, p. 2, 2 mar. 1924.

← ANTERIOR PROXIMA → INICIO

0 comentários:

Postar um comentário

Deixe aqui seu comentário, opinião e sugestões. Um forte abraço!