O aparecimento dos salões e grêmios na
cidade de Ipu, nos anos iniciais do século XX, é parte de uma tradição que, no
Brasil, remonta aos primórdios do século XIX. O final deste século e anos
iniciais do século XX são os momentos por excelência de sua proliferação na
capital republicana, como demonstra Brito Broca em sua análise sobre a vida
literária no Brasil[1]. Os salões e os clubes, no Rio de Janeiro, em fins de
século, não eram também uma novidade, uma vez que estes espaços surgiram ainda
muito cedo, após a chegada de D. João VI em 1808 e se desenvolveram durante o
período Imperial, como bem demonstra Wanderlei Pinho em seu estudo sobre
os Salões e Damas do Segundo Reinado[2].
No caso de Ipu, os salões e grêmios têm
suas especificidades próprias. É resultado, principalmente, de uma ânsia ou
vontade de um grupo de pessoas para viver a modernidade e, por
meio deles, marcar posições, buscar distinções.
Quando foi fundado? Aqui há uma
confusão. Historiadores e memorialistas locais, baseando-se na Revista
dos Municípios, de 1929, aludem que aquela associação foi erguida em
1924. Citam como prova a passagem escrita naquele periódico ao dizer que ela
“foi fundada em 1924, instalando-se no dia 12 de outubro desse anno, quando
tambem realizou a partida inaugural e empossou a primeira diretoria”[3].
Mas o Jornal Gazeta do
Sertão, que circulou em 1913, amplamente noticia sobre as partidas
realizadas pelo Grêmio Ipuense em suas páginas, quase que
semanalmente. Em uma de suas edições, ao noticiar sobre um de seus bailes diz
que a associação existe há pouco tempo[4]. A questão é que em 1924 ela aparece
com a denominação de Grêmio Ipuense Sociedade Recreativa
Dançante. Trata-se de fato da mesma associação, pois seus
frequentadores são os mesmos.
Segundo o Correio do Norte,
jornal que circulou em Ipu entre 1918 e 1924, o Grêmio Ipuense foi
fundado em 1912[5]. Ao se desfazer, deu origem, em
seguida, ao Grêmio Recreativo 7 de Setembro. Este último se
transformaria no Grêmio Ipuense Sociedade Recreativa Dançante. Mas,
algumas mudanças foram operadas, o que muito provavelmente justifica as trocas
de nomes.
As festividades ocorriam à noite e a
sede do Grêmio era iluminada a carbureto. A solenidade
revestia-se de certa formalidade. Os convidados (espécie de sócios) eram
recebidos pela comissão de recepção, geralmente oito pessoas, e os conduziam ao
salão de recepção, onde outra comissão, formada pelos diretores de salão, os
recebia e os acomodava. Quando todos os convidados já estavam apostos,
iniciava-se o que se chamava de “partida literária”. Era uma espécie de sarau literário.
Ao que parece, fazia-se um discurso retórico, liam-se poesias e abria-se o
espaço para discussões entre os intelectuais. Servia-se, aos presentes comida e
bebidas, de responsabilidade da comissão de Buffet, sob a direção de pelo menos
quatro pessoas. Finalmente, uma banda contratada tocava quando o salão de festa
se abria para as danças. Neste momento, o espaço era da soirée e
entrava, muitas vezes, pela madrugada.
Continua...
Sobre a imagem: Palacete Iracema. Fotografia que consta
no Álbum Comemorativo do Centenário de Emancipação Política da cidade, de 1940.
Cópia digitalizada pertencente ao acervo do autor. O documento original é do
acervo de Francisco de Assis Martins.
[1] BROCA,
Brito. A vida literária no Brasil – 1900. 4. ed. Rio de Janeiro:
José Olympio: Academia Brasileira de Letras, 2004.
[2] PINHO,
Wanderley. Salões e Damas do Segundo Reinado. 3. ed. São Paulo:
Livraria Martins Editora, 1959.
[3] Cf. Revistas
dos Municípios. Op. cit., p. 44.
[4] Assim inicia o artigo ao dar ampla divulgação do sarau realizado
em seus salões, por ocasião da passagem do dia 7 de setembro. “Às justas
glorias do que já se ufana o ‘Gremio Ipuense’ em seu curto período existencial
[veio] juntar-se a da elegante e linda recepção dada aos seus associados em a
noite do 7 de setembro”. Gazeta do Sertão. Ipu, p. 4, 12 Set. 1913.
[5] Gremio Recreativo 7 de
Setembro. Correio do Norte. Ipu, p. 2, 2 mar. 1924.
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