A fundação do Grêmio, e de
outras associações congêneres, responde ao desejo de viver os valores do
progresso e da modernidade, de buscar distinção e reconhecimento como ser
civilizado, marcando posição em relação à população menos abastada,
espelhando-se em modelos alienígenas.
Enfim, surgiam como resultado da
prática social de um grupo restrito de pessoas, os salões e uma nova forma de
sociabilidade para os grupos abastados. Frequentar as soirées do Grêmio se
revestia de uma desejada distinção social. Ir aos seus bailes revestia-se de um
simbolismo ímpar. Era sinal distintivo de poder, de uma aura superior. Lá se ia
para ouvir música, dançar, para uma “partida literária” e para o convívio de
relações familiares. Os salões daquela agremiação funcionaram como importante
para a vida social e para os relacionamentos afetivos de seus associados.
No caminho trilhado por aqueles homens,
que consistia em dotar a cidade de signos da modernidade, a fundação de novos
espaços de sociabilidade, que seguia uma pragmática própria, foi uma prática
levada a cabo. Se, de um lado, buscava-se lutar contra os costumes “arcaicos”,
de outro, efetivamente se procurou fundar outro tipo de sociabilidade, aberta
aos segmentos mais abastados da cidade, alinhada com os ideais de civilidade.
Assim, ao mesmo tempo em que tais
espaços eram entendidos como fundamentais a um grupo de pessoas, sedentas por
distinção, também eram buscados como necessários a um povo em via de
“civilizar-se”. A sua instituição era informada pela necessidade de instituir
um padrão de comportamento mais condizente com o espírito dos valores
defendidos. Foi dentro desse receituário que surgiram o Grêmio
Ipuense (1912) mais tarde Grêmio Ipuense Sociedade Recreativa
Dançante (1924), o Gabinete de Leitura Ipuense (1919),
o Centro Artístico Ipuense (1918) e a Euterpe Ipuense.
Fazer parte de tais associações
denotava distinção e marcava posições. Elas exerciam um fascínio sobre aqueles
desejosos por se parecer superiores. As representações construídas em torno de
seus membros caminhavam no sentido de mostrar que eram modernos e civilizados
em oposição à grande maioria da população, sempre visualizada nos periódicos
como portadoras de costumes “archaicos”, “atrasados”, “bárbaros”.
O grupo de pessoas que fazia parte de
seus quadros buscou se apegar aos valores da modernidade como forma de produção
de positividade, para qualificar a si mesmo (uma classe ou grupo social) como
superior e desqualificar o que considerava arcaico, inferior. Na verdade, os
símbolos e signos ligados à modernidade eram procurados por aqueles que
transitavam pelos salões chics. Seus valores estéticos eram
cobiçados como forma de distinção. Assim, constituiu-se numa espécie de “poder
simbólico”, isto é, como um poder capaz de “construir a realidade” e produzir
sentido (imediato) para o mundo, além de integrar indivíduos em torno de
valores comuns. Os símbolos, como defende Bourdieu, são instrumentos, por
excelência, da integração social. Na medida em que se traduzem como
instrumentos de conhecimento e de comunicação, tornam possível o consensus acerca
do sentido do mundo social que contribui essencialmente para a reprodução
social[2].
Sobre a fotografia: Diretoria da Associação Comercial de Ipu em 1928. A sede funcionava no
Palacete Iracema. Todos eram sócios do Grêmio[1]. Cópia digitalizada
pertencente ao acervo do autor. O documento original é do acervo de Francisco
de Assis Martins.
[1] Na fotografia
aparece o seu diretor, Joaquim de Oliveira Lima, sentado e de branco, Thomaz de
Aquino Correia (vice-presidente), sentado e na ponta direita. Os demais são,
José Oswaldo de Araújo, sentado ao centro (de óculos), ao seu lado direito,
também sentado, está Francisco das Chagas Paz. Na ponta esquerda, sentado, está
o Cel. José Raimundo de Aragão Filho. De pé, da esquerda para a direita, estão
o Cel. Gonçalo Soares de Oliveira, Dr. Francisco das Chagas Pinto, José Gentil
Paulino e Dorotheu Alves Farias. Fonte: Revista dos Municípios, Fortaleza-Ce,
ano I, nº 1, fev. 1929, p. 53.
[1] BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Lisboa:
Difel, 1989.
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