Há um romance de Dostoiévski, dos menores dentro de sua extensa obra, que traduz muitos dos desejos buscados pela maioria das pessoas no mundo em que vivemos. O personagem central é Aleksei Ivánovitch. É um nobre russo, jovem e culto e que trabalha como tutor na casa de um general, Zagoriánski, que está vivendo na Alemanha, hospedado em um hotel. Está apaixonado pela enteada do general, Praskóvia, chamada de Polina por seus familiares. O romance constitui a linha central do enredo. Quase todos os personagens agem movidos unicamente por interesses materiais.
Aleksei é atormentado pelo sentimento
de inferioridade social, por ser humilde tutor na casa do General. Apesar de
sua condição de nobre russo e culto, recebe um tratamento desdenhoso, pouco
melhor que um servo. Pretendendo o “amor” de Polina, que mantém um romance por
interesse com outros, acredita que se ganhar no jogo, na roleta, e ficar rico,
poderá conquistá-la. Estudando a roleta por um bom tempo, percebe uma
regularidade matemática na sequência dos números sorteados. Ganha, portanto,
muito dinheiro, e quebra o cassino.
Não se importava com o dinheiro.
Encarava-o apenas como um meio para atingir um fim: ter Polina em seus braços.
Aqui, creio, está a essência do romance de Dostoiévski. Por que as pessoas se
matam, quase em desespero, para acumular tanto dinheiro se não precisam de
muito? E a resposta de Dostoiévski, por meio de um personagem de seu romance, é
a de que as pessoas buscam o dinheiro não simplesmente pelo dinheiro em si, mas
pelo poder que ele exerce sobre as pessoas. Os objetos, o sapato, a roupa, a
casa, todos comprados com dinheiro, são signos que impõem poder e distinção,
respeito, admiração, sucesso, inveja, como se tivessem alma, aura, essência,
espírito!
O dinheiro, em grande quantidade, não
interessava a Aleksei Ivánovitch. Queria-o apenas pelo poder que ele poderia
exercer sobre Polina. Percebendo que a maioria das pessoas agiam da mesma
forma, pouco lhe importava se teria o amor ou não daquela que queria nos seus
braços. Apenas a queria perto de si. Já que todas as pessoas são tão iguais,
agindo por interesses próprios, de que importava o amor?
Desprezado pelas pessoas, por não ter
tanto dinheiro, era o único a dar grande valor ao conhecimento, à leitura, à
erudição, dado ser um homem culto. Talvez por isso, não se importasse tanto com
a materialidade da moeda, acumulá-la não parecia a coisa mais importante do
mundo.
Esse é o ponto central. A maioria das
pessoas é muito pobre, tem apenas dinheiro. Isso é muito pouco! Como as pessoas
são tão vazias! Elas ou passam a maior parte de suas vidas correndo
desesperadamente atrás dele, sendo capazes de quase tudo para consegui-lo,
pensando nele o tempo todo, ou maquinando uma forma de atraí-lo, pouco se
importando se isso será, no final, bom ou ruim para si mesmas. Parece-lhes tão
óbvia, natural, a relação direta entre bem-estar e dinheiro, felicidade e
dinheiro, que não se dão ao luxo de, pelo menos, refletir sobre isso. Talvez
desprezem o livro (“um montão, um amontoado de
muita coisa escrita”), o conhecimento, a ciência, a literatura, o saber.
Talvez a riqueza
esteja exatamente naquilo que é mais desprezado! Aleksei Ivánovitch talvez estivesse certo!
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