O trem chegando à cidade. Sem data. Do acervo de Francisco de Assis Martins |
O forasteiro ou viajante que queira
passear pela cidade e identificar os símbolos ou vestígios de um passado que se
mantém vivo no presente, pode começar a sua caminhada pela Avenida Dr. Eusébio
de Sousa, no Bairro do Corte. O casario desta rua está disposto ao longo dos
trilhos do trem, de um lado e outro. O bairro é assim chamado em
função das obras de construção da Ferrovia, que abriu caminho em meio a um
“barranco” com altura aproximada de 5 metros. A partir daí, o casario começou a
ser edificado de um lado e outro dos trilhos da ferrovia.
Seguindo
a linha do trem no sentido Camocim-Ipu, o viajante chega à Estação Ferroviária,
onde no dia 10 de outubro de 1894 tinha lugar a solenidade de inauguração
daquele prédio “monumental”, para os padrões locais, e onde vários discursos
saudando a chegada da modernidade e do progresso foram levados a cabo. Foi a
primeira vez que o trem circulou sobre os trilhos da cidade, fazendo vibrar os
sentidos aguçados de parte de sua população. A Estação passou a ser o local
mais movimentado da cidade: espaço de chegada e partida de pessoas, mercadorias
e valores, como mostra uma crônica escrita por Antonio Tarcízio Aragão, no Jornal dos Tabajaras, lembrando à época
em que ainda existiam os trens de
passageiro:
Na estação, o som característico de um
estridente sino que ecoava em todos os recantos da cidade, fazia uma espécie de
chamado aos passageiros e indicava que o trem havia partido da última estação e
que, dentro de 30 minutos chegava nessa cidade. A reação do povo era imediata,
quem ainda não estivesse na estação convergia em direção a ela mesmo que não
fosse viajar. Muitos iam apenas ver o trem passar, saber das novidades e de
quem chegava ou partia (...). Quando a locomotiva apitava no corte ou na curva
das pedrinhas[1] o
alvoroço era generalizado (...). Os vendedores de guloseimas, agitados, corriam
de um lado para o outro e gritavam oferecendo os seus produtos. (olha o café
quentinho feito na hora, olha a tapioca, laranja, doce, batida da Sussuanha,
tijolinho de coco)[2].
Mas, o viajante se decepcionaria ao
perceber que não há mais ninguém ali, só o prédio fechado, embora recuperado,
onde em dias de chuva ou em noites frias, animais descansam sob a gare da
Estação que, outrora movimentada, recebia os artigos vindos de todos os locais
do Brasil e da Europa e embarcava os muitos fardos de algodão, açúcar e artigos
diversos produzidos pela economia local e estacionados ali, pois o depósito do
prédio não dava vazão para tamanha quantidade de produtos.
Continua...
[1] O Bairro
Pedrinhas tem esse nome em função da Seca de 1932. Nesta ocasião, foi erguido
em Ipu, na localidade do Espraiado, distante cerca de três quilômetros da sede
do município, um Campo de Concentração de flagelados da seca. O Campo era um
local que reunia os famintos para a assistência do governo. A mão de obra dos
assistidos foi amplamente usada para as obras locais, principalmente na
pavimentação das ruas. Muitos deles transportaram pedras da localidade, onde
hoje é aquele bairro, para o centro da cidade. As pedras serviam para os
“calçamentos”. Muitas ruas de Ipu foram pavimentadas com as pedras daquela
localidade. Com o fim da seca e o
fechamento do Campo de Concentração, alguns dos assistidos, muitos vindos de
outras cidades, se estabeleceram nos subúrbios da cidade, alguns deles na
região de onde se tiravam as pedras. O bairro Pedrinhas fica do lado oposto ao
bairro do Corte.
[2]ARAGÃO,
Antônio Tarcizio. Resgatando Memórias. Jornal dos Tabajaras. Ipu, p. 3, ago.
1995.
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