sábado, 4 de janeiro de 2020

O retrato de Dorian Gray. Parte I




O retrato de Dorian Gray é apontado por muitos como um grande clássico da literatura internacional. A ideia de beleza ou perfeição física é um de seus grandes temas e remete ao mito grego de Narciso, que cultua a sua própria imagem e vive em função dela. É um romance bem instigante e que nos leva à reflexão. Vale a pena ler antes de morrer.
Romance de Oscar Wilde, escritor holandês, foi publicado, em sua versão final, em 1891. Tem como cenário a cidade de Londres aristocrática do século XIX, da era Vitoriana, e como personagem central o encantador e belo jovem, Dorian Gray, cuja beleza exerce influência marcante sobre todos aqueles que o rodeiam. Torna-se inspiração para o pintor, renomado, Basil Hallward, que o retrata em um quadro. Dorian torna-se não apenas um modelo para o artista, mas o inspira na produção de uma nova arte, com traços modernos.
Na casa do pintor, Dorian é apresentado àquele que exercerá sobre o seu espírito uma influência devastadora. Trata-se do Lorde Henry Wotton, um hedonista, aristocrata inglês e amigo de Basil. O herói de Oscar Wilde é seduzido pelas ideias e inteligência de Henry e passa a venerar o mundo da beleza e dos prazeres imediatos, desprezando as consequências de seus atos, inicialmente, e toda a moral mediana de uma sociedade hipócrita, a seus olhos, e que vive de aparências.
Dorian supera seu mestre e se entrega à superficialidade dos prazeres e ao egoísmo. A partir de então, parece ter início uma espécie de conflito psicológico que oscila entre dar vazão aos seus desejos e à reflexão sobre sua verdadeira alma, inscrita apenas no seu Retrato, pintado por Basil. Ali estava pintado algo horrível aos seus olhos. O quadro revelava-lhe os segredos ocultos de sua alma, por isso, o mantém escondido de todos, guardado em sua biblioteca, trancada à chave, e coberto por um manto.
Incitado por Henry, passa a cultivar um grande medo: a velhice e a perda de sua juventude. O seu retrato deveria imortalizar a sua juventude. Mas, paradoxalmente, parece ocorrer o oposto. Ao contrário da natureza humana, o rapaz preserva seus sinais físicos da beleza e da juventude enquanto sua imagem no quadro revela sinais de velhice ou de seus medos mais ocultos: os segredos de sua alma.
Dorian parece viver esse conflito entre dar vazão aos seus desejos, aproveitar a sua juventude, e cultivar seu espírito. Esses dois lados parecem representar os outros dois personagens centrais do romance, que estabelecem relações com o protagonista: o pintor Basil, que o ver como modelo e inspiração e pretende que continue sendo aquele rapaz doce e admirável, que cultiva a alma, e Henry, que desperta-o para os prazeres imediatos da vida. Esses dois outros personagens parecem representar a verdadeira dualidade da condição humana, que consistiria no conflito entre responder aos instintos ou se conformar com as regras morais e sociais. Henry é o lado cínico, hipócrita e maldoso, que defende a busca dos prazeres e desejos humanos a qualquer custo, sempre sugerindo ao herói do romance viver os momentos que sua beleza e juventude lhe proporcionam, enquanto Basil é aquele que tenta trazer Dorian Gray para o seu lado puro e gentil, tentando demonstrar que são justamente tais qualidades que provocam fascínio nas pessoas a sua volta.
Tive a impressão de que o autor buscou fazer uma crítica à sociedade inglesa de sua época ao demonstrar os preconceitos sociais e a não aceitação, em seu meio, daqueles que quebravam às normas morais defendidas, caso de Dorian Gray. Este, embora despreze uma série de convenções, parece viver uma vida dupla: no seio da sociedade e dos salões mantém uma postura “civilizada” e dentro dos padrões morais estabelecidos por ela, mas tão logo deixa os seus salões, busca às diversões ocultas, longe dos olhos arregalados de todos aqueles que se horrorizariam com sua conduta.
O retrato de Dorian Gray, pintado por Basil, horroriza o herói do romance precisamente pelo fato de revelar a sua alma. A pintura de Basil parece exteriorizar o que Dorian quer esconder: sua decadência moral, sua consciência, sua frieza e coração gelado, indiferente à quase tudo, sofrendo apenas se seus atos colocam em risco sua liberdade (diante do perigo de ser preso) ou vida (diante do perigo de ser assassinado).
Dorian Gray é uma espécie de novo Narciso, amante das artes e dos prazeres carnais, parecendo querer transformar sua vida em arte. Ao tentar enfrentar a sua culpa, esconde-se na superfície de seu retrato. No entanto, não consegue libertar-se de sua consciência.
Wilde parece perguntar se o caráter de uma pessoa pode ser determinado por sua exterioridade, pela superficialidade, tal é o caso de Dorian Gray, cuja beleza e encanto esconde uma alma degradada e engana a todos.
Seguindo a vida ao lado de Henry, Dorian se torna um sedutor, torna-se egoísta, libertino e mau, embora seu rosto permaneça jovem mesmo aos quarenta anos.

Continua...


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