Deparei-me,
durante esta semana, com várias análises dando conta do atual momento político
que vive o país. Duas delas, quase unânimes, são particularmente importantes. A
primeira, defendia a tese de que o afastamento do presidente da República era
iminente, dado o seu isolamento político. A segunda, que os outros dois poderes
da República, o legislativo e o judiciário, daqui para frente, colocariam
freios aos excessos do chefe da nação, enfraquecido com a saída de Sérgio Moro do Ministério
da Justiça e Segurança Pública.
Pode
ser que uma ou outra tenha razão. Da minha parte, não concordo nem com a primeira
e nem com a segunda. Acredito que Jair Messias Bolsonaro tem seu projeto próprio
de governo e que, se houver condições propícias, tentará colocá-lo em prática
na primeira oportunidade. Resta saber que projeto é esse? Para defini-lo é
necessário, antes de mais nada, entender, em linhas gerais, um pouco sobre o
seu atual governo, de um lado, e sua personalidade, de outro. Comecemos pela
última.
O
presidente já demonstrou que é personalista, autoritário e intransigente. De um
lado, não admite que nenhum ministro ou membro de seu governo tenha, em primeiro
lugar, mais visibilidade do que ele e, em segundo, maior popularidade. Dois
exemplos são suficientes: quando Sérgio Moro aparecia com frequência na mídia e
tinha grande popularidade, isso acarretou nele muitos ciúmes, fortalecendo sua
suspeita, segundo algumas análises, de que, numa possível disputa pela reeleição,
Moro seria seu adversário e candidato forte. A relação do ex-juiz com o chefe
da nação azedou aos poucos até o recente rompimento “definitivo”.
O
segundo caso foi o do ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Tão logo
adquiriu projeção e visibilidade, no combate à pandemia da Covid-19, com suas
coletivas diárias e elogios até mesmo dos adversários do governo, foi igualmente
alvo de ciúmes não disfarçados.
De outro lado, sendo fiel a sua formação militar, não aceita em hipótese alguma
decisões de seus ministros que não passe por suas mãos e tenha o seu aval,
deixando explicito que é ele quem manda, e que, como no exército,
existe uma hierarquia a ser “obedecida”. Mais ainda, que não tem essa de
autonomia e que, como a “caneta está com ele”, pode e deve interferir onde bem entender.
Também, por isso, caiaram Mandetta (que não combateu o isolamento social como
queria o presidente) e Moro (por supostamente não aceitar interferência na
Polícia Federal), depois de indisposições com o chefe da nação, por não aceitarem,
aparentemente, se sujeitar ao autoritarismo do presidente.
A
intransigência de Bolsonaro, em muitos assuntos, desde o início, se evidencia
no fato de não aceitar ser contrariado. Gosta de estar rodeado de apoiadores, de ser ovacionado e aplaudido, de ser defendido por membros de seu governo. Parece, na
verdade, cobrar isso deles. Sua opinião e as suas “verdades” não admitem
contestação, característica de sua veia autoritária. Estabeleceu, por exemplo, mais
recentemente, contra tudo o que diz a ciência, os cientistas, médicos e organismos
internacionais como a ONU e a OMS, que há histeria no caso da Covid-19, que o
isolamento social é um erro e que, portanto, de uma forma ou de outra, 70% da população
será contaminada, percentual, creio, criado por ele mesmo.
Quanto
ao seu governo, buscou apoio de líderes evangélicos, de agentes da segurança
pública, sempre estabelecendo um discurso sensível a tais categorias, e se acercou,
por todos os lados, de militares de alta patente, buscando, claramente, o apoio
do exército. Adotou uma espécie de política de controle de instituições
importantes, flertando, ultimamente, com a Polícia Federal. E tem dado mostras,
com suas atitudes, em desrespeitar a Constituição e as instituições democráticas.
Atacando
as medidas adotadas por governadores e prefeitos no enfrentamento do avanço da
Covid-19, incitou e participou de manifestações públicas de seus seguidores, que
defendiam abertamente golpe militar e a volta do AI-5, buscando claramente
apoio popular para as suas decisões. Atualmente bate de frente com decisões do STF
e se aproxima, negociando cargos e vantagens, dos partidos de centro, numa intenção de se cercar, no Congresso Nacional, de base segura contra, no
mínimo, um processo de impeachment (impedimento).
Um dia
bate de frente com decisões do STF e do Congresso Nacional, e incita seus
seguidores contra aqueles que impõem freios às suas atitudes e deliberações. Em
outro dia recua, para depois voltar atrás. Não que esteja perdido, mas, ao que
me parece, apenas maturando qual decisão tomar.
Conhecendo
as ideias do presidente, sua personalidade, sua trajetória política e suas
atitudes, parece ficar bastante evidente qual é o seu projeto! Se você ainda
continua lendo e não entendeu, releia e tire suas próprias conclusões! Talvez o
seu projeto não se encaixe na complexidade de uma democracia. Para uma
tentativa de colocá-lo em prática, talvez faltem apenas condições necessárias:
apoio do exército, um cenário que justifique sua ação e a aprovação de seu
séquito.
O
momento parece se aproximar: um país com sérios problemas econômicos e de saúde
pública, estraçalhado, com uma população amedrontada, investigações que chegam a
cada dia mais perto da família do presidente, além do depoimento de Sérgio Moro,
na Polícia Federal, com supostas provas das acusações que fez ao governo de
Jair Bolsonaro há cerca de uma semana.
Finalmente,
o cenário piora com uma possível abertura de processo de impeachment no
Congresso Nacional.
Alguém
duvida que estamos no caminho? A cova, parece, já está aberta!
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